Entre este mundo e o outro
Percorro tudo à minha volta, decorando cada momento, observando cada pessoa que passa por mim sem dar por isso. Ninguém me vê, ninguém me consegue ver.
A senhora que empurra o carrinho de bebé deixa escapar um sorriso na minha direcção. Não é para mim. Um homem aproxima-se e dá-lhe um beijo, passando a mão na cabeça da criança.
Vejo dois jovens namoriscarem atrás de um pilar do shopping, a mãe do rapaz observa-os sentada num banco.
Todos parecem ter uma rotina que seguem à risca: algo para fazer, alguém para falar; eu não. Eu permaneço aqui, sentado neste banco de pedra, invisível aos comuns mortais. Sou um transeunte com a vida mudada. Um fantasma que não escolheu ser assim. Sou a personificação da solidão. Vivo entre este mundo e o outro completamente só e cheio de gente.
Aproxima-se um senhor. Como todos, não me vê. Senta-se no meu banco preenchendo a minha perna transparente. Sente-se sozinho, consigo perceber. A sua mulher morrera e ele sentara-se ali, olhando o vazio.
A solidão consegue consumir-nos: tolda-nos o discernimento. Desejamos morrer, queremos ter quem amamos do nosso lado. Porém, isso nem sempre acontece. Comigo não foi assim: eu continuo sozinho e acompanhado.
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