segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Concurso "A Imagem": É dificil libertarmo-nos deles


Há alturas em que temos de os deixar partir. Chega aquela hora e deixamos de os proteger. Sentimos sempre o vazio dentro de nós. Sorrimos na despedida e choramos assim que a porta se fecha. Faz parte desta profissão a tempo inteiro que é ser mãe.

- Não quero mãe. Eu quero ficar contigo. Por favor mãe. Não me deixes aqui sozinho. – O pequeno Tiago de 5 anos estava aterrorizado enquanto via os meninos maiores que ele na escola. Era o primeiro dia de escola. Tiago estava com medo do mundo novo. Pensava que os outros meninos não iam querer brincar com ele e esta era a primeira vez que ia para um sítio sozinho, sem a mãe ou o pai.
- Não te preocupes, pequenino. A D. Céu vai cuidar muito bem de ti e vai-te apresentar aos outros meninos. Vais gostar e vais fazer muitos amigos vais ver. Tiago parecia não acreditar, e quando entrou na sala e viu os outros rapazes a jogarem à bola, as meninas a brincarem com as bonecas e muitos outros a fazerem desenhos, o seu medo simplesmente se tornou maior. Era difícil para a mãe, ver o filho a chorar até ela se vir embora. Mas era algo que tinha de ser feito. À noite, quando o Tiago voltou do seu primeiro dia, estava sujo de terra e ria-se ao colo do pai. Tinha estado a jogar com os novos amigos e a fazer bolos de lama para dar as meninas.

- Mãe, vamos embora, não me quero atrasar. Hoje é o meu primeiro treino na equipa principal! – Tiago puxava a sua mãe pelo braço, quase atropelando todos à sua frente. A família estava toda reunida pois hoje era um grande dia. Tiago, já com 12 anos, preparava-se para conhecer o seu novo treinador. Passara da equipa B do clube de futebol local para entrar no onze principal. Era uma grande vitória para o rapaz e merecia ter casa cheia. Cheia de amigos e familiares prontos a aplaudirem-no de pé.
Quando chegaram ao campo, Tiago ficou nervoso, mas como um rapaz crescido que era não o mostrou. Porem a mãe reconheceu-o e deu-lhe a mão. Para que fosse mais fácil para ele sentir que estavam ali a apoia-lo. Quando o treinador o cumprimentou, o nervosismo desapareceu e deu lugar ao divertimento. Tiago treinou até não poder mais para que o treinador visse nele uma boa aposta. A família aplaudira todos os seus remates e fintas, fazendo Tiago sentir-se em casa.

Hoje era O grande dia. Na igreja, Tiago esperava ansiosamente por Clara. Caminhava lentamente de um lado para o outro do altar enquanto a mãe tentava que se mantivesse composto. Hoje era o dia em que o seu filhinho largava o ninho materno para criar o seu próprio lar. Era difícil para os pais verem o seu menino crescer. Para eles o tempo passara tão depressa. Até parecia que tinha sido ontem o dia do seu nascimento. As dores, as contracções, a correria dentro do hospital, e oito horas depois estava um belo menino cá fora. Fora um parto complicado, mas nada valera mais a pena.

Cinco anos após o casamento de Tiago e Clara, um abalo sísmico fez-se sentir no país e parte da cidade onde eles moravam ficara debaixo de água, lama e entulho. Tiago, Clara e os dois filhos não sobreviveram. Fora a maior perda de todas.
A mãe de Tiago chorara a sua morte anos a fio. Enquanto se perguntava porque tinha sobrevivido e o seu filhinho não. Mantivera-se fiel à ideia de que ele voltasse. Um dia. Quem sabe? Talvez existisse mesmo a ressurreição.
Mas hoje, hoje era o dia. Hoje era o dia de o deixar partir. De o deixar enfrentar o mundo. O verdadeiro mundo.

Sempre que tínhamos de os deixar enfrentar algo sozinhos, sentíamo-nos felizes e realizados por eles. Sabíamos que eles voltariam no final do dia, ou até da semana. Mas quando se trata da sua alma… é difícil libertarmo-nos deles.
Hoje, Ana Maria é uma mulher mais forte. Com a sua idade já avançada, espera o dia em que possa reencontrar o seu amado filho e os seus netos. Mas até lá, vai continuar a aquecer o seu ninho de andorinha, o seu coração.






concurso: shot baseada em imagem (imagem a cima apresentada)

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